quarta-feira, 26 de abril de 2017

Meu velho pai!



A figura paterna, para um criança, significa mais do que proteção, exemplo e admiração. Para as meninas, o pai é um misto de beleza e segurança, enquanto para os garotos, ele é a verdadeira personificação dos heróis, poderosos, fortes e capazes de resolver todo tipo de problema. O meu pai, foi na minha vida, tudo isso e muito mais. Além da aparência física, éramos parecidos também nas atitudes e nos gostos, além da alma poética. Foi com ele que aprendi a contar histórias fantásticas para meus filhos e netos e os segredos da marcenaria, que foi minha profissão até me aposentar, há alguns anos. Não era algo que desejei para a minha vida, mas não havia a opção da escolha e sim do mandonismo. Meu desejo era ser médico, mas além das condições financeiras inviáveis para os estudos, meu pai não aceitava que um filho lhe traísse em suas decisões. E, como bom menino, eu o obedeci. E me dei mal. Não fui feliz como marceneiro e me arrependo de não ter enfrentado o meu pai. Eu poderia ter seguido os meus anseios de rapaz cheios de sonhos, mas fui pouco corajoso.
Quando são os adultos que tiram as escolhas dos filhos, impedem que sejam autônomos e criam uma sensação de abandono. Foi o que senti. Porém, meus sonhos profissionais foram logo ocupados por outros, pessoais. Acabei me casando cedo e rapidamente tive muitos filhos e é para eles que eu trabalhava de sol a sol, incansavelmente. E, quando tudo ficou muito difícil em Divinópolis, me mudei para Belo Horizonte, trabalhei também em Ipatinga, interior do Estado, e em Brasília, capital do Pais. Longe da família, o vazio tomava conta dos meus dias e o que me empurrava, o que servia de alavanca para viver era o sonho de um dia deixar aquilo tudo e ficar apenas em casa, com minhas crianças. E foi esta distância o fato que mais marcou na minha vida.
Em uma de minhas viagens, minha filha Carla, então com três anos, muito falante até hoje, me contou que já tinha aprendido porque o copo dela não se quebrava: - É porque ele é de plástilico, papai! A surpresa da descoberta, em palavra erra, me encantou naquele domingo, poucas horas antes de me despedir para retornar à rotina na cidade grande. A rodoviária me esperava e era no ônibus que as lágrimas corriam do meu rosto, enquanto eu olhava pela janela a noite escura do lado de fora. Minhas quatro meninas estavam em casa com minha esposa, sem mim, e isso não era justo! Eu não estava cumprindo o meu dever de provedor, de cuidador e protetor da minha família, que aprendi com o meu pai. Então, para quê eu servia?
Meu pai, na porta da marcenaria










Em outra visita à minha casa (sim, eu era visitante a cada 15 dias), minha filhinha Josiane, com uns dois anos, começou a colocar no meu bolso, moedas que havia guardado num cofrinho e me lembro que chamei sua atenção várias vezes, enquanto brincávamos no chão da copa, de ladrilhos cor-de-rosa. Ela se divertia, e eu tentava educá-la, mostrando que sua atitude não estava sendo adequada. Muito pequena, ela não me obedecia e por vezes saía correndo de mim. Essa brincadeira de gato-e-rato se deu a tarde toda, até que me despedi para voltar à BH. Só então aprendi que as lições de vida acontecem a toda hora. Naquela noite, me faltou dinheiro para a passagem. Envergonhado, procurei trocados no bolso e não encontrei. Até que achei, no fundo do bolso, várias moedinhas e foram elas que me ajudaram a completar o valor do transporte. Num misto de vergonha e satisfação, contei o dinheiro, paguei e embarquei. E me culpei por não ter sido legal com minha filha, e sem querer, ela havia sido muito lega comigo. Foi a noite que mais chorei. E tomei a decisão de que sairia daquela vida de labuta sem prazer.
Na quinzena seguinte voltei à Divinópolis, peguei a minha família, pus no carro do meu cunhado (na época um Opala amarelo - ele era taxista), juntei alguns objetos como panelas, cobertores e alimentos, e viemos para Belo Horizonte. Passamos alguns meses na casa de parentes e algum tempo depois nos mudamos para um barracão longe do centro. Era da pior qualidade, muito precário. Mas, ali nos instalamos e não fomos felizes, mas sobrevivemos. Não sei como seria a minha vida se eu tivesse tomado outro rumo. Nunca saberemos como seríamos numa tomada de decisão fora do que imaginamos. Mas, percebo que a vida às vezes tem uma linha que já é traçada por Deus e não adianta ir contra isso. Só sei que a vida não tem muitos segredos, há apenas duas opções: ir ou ficar, sim ou não, querer ou não querer. Pronto. O que seremos diante disso, cabe à nós, mas quem manda é o destino. Esse e difícil de mudar.

Beijos,

Paulo José


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