sábado, 23 de setembro de 2017

A árvore do chiclete

Quando eu era criança, Divinópolis era uma cidade que tinha um cheiro próprio, exalado pelas árvores que ladeavam as ruas do centro. Elas ficavam também em restaurantes, no fundo das casas e do jardim de infância onde minha filha, Carla, estudava. E foi ela quem transmitiu a história que inventei da tal árvore. Como os frutos têm o miolo rosa, disse às crianças que se tratava de goma para fazer chiclete. E assim ficou, num folclore entre nós, que causava desejo de comer a tal planta, como várias vezes pude ver no alpendre de casa. Minhas meninas, muito pequenas, tentavam, com os dentinhos de leite, afiados, sentir o gosto daquelas castanhas, que nada mais são do que frutos selvagens. 
A vida é assim mesmo. Simples, mas complexa ao mesmo tempo, como nossas personalidades. Somos um ser criativo, que vamos inventando descobertas onde não existem. Uma simples bobagem pode se transformar em histórias fantásticas, para a explicação de mundo para as crianças ou mesmo para nós, adultos. Meus filhos cresceram com essa idéia de fantasia que passo à eles, porque sou assim. Costumo ver com poesia em cada dia da minha vida, e agradecer pela beleza das flores, cheias de mistérios e perfume.
Minha filha, Carla, junto à árvore que enfeitava Divinópolis
Como todo pai-inventor-cientista, criei outras estratégias para explicar fatores naturais, que eu jamais soube de onde vinham. O único problema é que quando as crianças iam para a escola, comentavam com os colegas e professoras, que muitas vezes as ridicularizavam com suas explicações acadêmicas, tirando toda a alegria das minhas invenções. Constantemente elas chegavam em casa, decepcionadas, em prantos, envergonhadas, porque a explicação sobre os fenômenos, era diferente da minha. Em contrapartida, eu apenas ria e compartilhava com minha esposa, que muito séria, me barrava pelas besteiras transmitidas aos nossos descendentes.
Eu havia me esquecido da árvore de Divinópolis, que fazia chicletes, até que numa viagem a uma pousada, vimos uma espécie num canteiro, enfeitando o local. Carla, sempre a mais observadora, e a mais atenta aos detalhes, foi quem viu a planta, em meio a outras, e fez questão de registrar aquele momento. Eu carregava meu neto, filho dela, recém-nascido, e foi um encontro de gerações, que mostrava que o passado nunca é esquecido e o presente depende dele para sermos felizes. Hoje, o Eduardo está com oito anos e adora minhas histórias inventadas, assim como meus filhos um dia amaram. Percebi que as invenções são a minha vida. E é por isso que as transmito com tanta alegria. Se os adultos já não conseguem ouvi-las por causa da falta de tempo, conto, então, para os netos, meus fiéis ouvintes. Quanto as árvores, de Divinópolis, se tornaram escassas e é raro encontrá-las pela cidade, como antigamente. Talvez elas tenham percebido que já não há muito deixaram de produzir a goma doce que as crianças tanto amam: parou de fazer chiclete!

Beijos a todos,

Paulo José.