quarta-feira, 27 de novembro de 2019

CARA A CARA COM O FANTASMA



Quando criança eu adorava passear com meu pai pela mata que rondava a nossa casa, em Divinópolis, MG, enquanto ele me ensinava a respeito de plantas e bichos. Ele também me  indicava caminhos e trilhas e me ajudava a desvendar as surpresas da natureza. Eu curtia tudo, ficava maravilhado com tanta beleza, mas o maior encantamento era estar ao seu lado e ouvir os casos tenebrosos que me assustavam e que à noite, me tiravam o sono. Mas, com meu pai eu me sentia seguro e a cada história contada por ele, eu ia me fortalecendo, como se amadurecesse mais rapidamente do que o normal, e colhia seus elogios, quando ele dizia: "você já está um rapazinho, meu filho", e me abraçava como quem ama alguém de forma incondicional. 
E foi numa tarde de um fim de semana que nós dois, já grandes amigos, além de pai e filho, resolvemos buscar frutas frescas e selvagens numa serra de Interlagos e nos deparamos com o medo que não estava previsto no passeio. Após a travessia de brejos e atalhos, e muita colheita, nos deparamos, já à noite, com uma sombra branca nos aguardando do outro lado do rio. Não havia barulho, mas um farfalhar assustador. Rapidamente nosso sorriso tomou conta do pavor e nossas pernas não obedeciam ao comando do nosso cérebro e nos obrigava a ficar imóveis no mesmo lugar. Eu, que até minutos atrás acreditava ter crescido o bastante para enfrentar fantasmas, me deparei com vários de uma vez só. Uns deitados e outros em pé, balançavam de um lado ao outro para nos provocar e avisar que não sairiam dali antes de levar nossas almas. 
Já quase desfalecendo, me lembrei das palavras do meu pai e me encorajei. Sim, eu era um quase adulto que nos tiraria daquela enroscada. Numa fome de leão e um frio de quebrar os ossos, eu só me lembrava da minha mãe, que certamente nos aguardava em casa com uma sopa quente sobre a mesa. E eu estava disposto a tudo, até mesmo a desobedecer o meu pai a não seguir adiante. E foi assim que aos poucos, me arrastando pelo mato e me cortando em espinhos, fui me aproximando dos fantasmas e sentindo todo o horror que jamais havia percebido em toda a minha vida. Trêmulo, da cabeça aos pés, fui me familiarizando com aquelas massas brancas que me aguardavam para dar o bote e me engolir de uma vez só. "Bem, pelo menos deixariam meu pai sobreviver", era o que eu pensava. Ao mesmo tempo, fui tomado por um orgulho de ser o homem da situação. Porém, à medida que eu dava passos ainda inseguros, fui observando que os fantasmas emitiam sons que me pareciam muito familiares. Destemido cada vez mais, continuei a caminhar até que percebi que os fantasmas, eram na verdade, vacas brancas de todo tamanho. Feliz e satisfeito, voltei correndo para contar ao meu pai sobre a minha descoberta, mas encontrei-o em cima de um tronco com o rosto tapado com as mãos. Estava gelado e trêmulo. Ao me ver, me abraçou com tanta força que me confortei. Sem conversarmos sobre o assunto, voltamos para o nosso lar. Mas, naquele dia, para espanto da minha mãe, recusamos o alimento: tinha carne bovina!


Paulo José.

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Amor de mãe!

Nestes tempos frios não há como não lembrar da minha mãe, uma mulher emblemática e misteriosa mas, ao mesmo tempo tão carinhosa. Relembrá-la é um modo de dizer que ainda a amo e que a distância entre nós dói a cada dia mais, desde que ela partiu para sempre.  Tê-la comigo, na mente e no coração, é um gesto  de amor àquela que tanto me faz ensinou e que tanta falta faz. Tenho saudades dos tempos de infância, quando meus pequenos problemas só acalmavam 1uando meus cabelos eram afagados por ela. Sinto falta do seu cheiro, do seu toque, do seu abraço, da cantina de ninar que cantava para mim todas as noites. E me sinto desamparado, pois não a tenho mais para me defender de outras crianças da rua, quando elas se juntavam para me bater. Tenho saudades da simplicidade da minha vida, da siesta depois do almoço e do caldo de milho como sobremesa. 
Minha mãe talvez não tenha sido tão bonita como eu imagino. Alta e magra até o fim da vida, ela em nada se parecia com outras mulheres do seu tempo, que ganhavam peso à medida em que tinham seus inúmeros filhos. As mães fazem parte do imáginário dos filhos de uma forma mágica e despretensiosa. Com lentes de aumento lotadas de amor, tudo o que enxergamos são braços fofos prontos a nos acarinhar, e um coração muito vermelho, que cabem muitas pessoas. Não vizualizamos suas rugas ou pele flácida. Numa aura de luz, percebemos aquele ser humano como um ser especial, criado por Deus especialmente para nós, filhos gratos. E por isso sofremos tanto quando elas se vão para sempre, nos deixando desamparados para o resto de nossos dias. 
Não há uma data especial para que eu escreva sobre a minha mãe. O que me levou a relembrá-la, com tanta saudade, foi o tempinho gostoso, que me remeteu ao passado, num piscar de olhos. Da varanda, assistindo o sol se pôr, sinto seu cheiro, percebo o seu abraço. Contenho o meu choro, limpo o rosto. Ela não está aqui. Fisicamente. Emocionado, repito o que sempre disse quando ela demonstrava o seu amor por mim: "Também te adoro, Mãe"! E sempre vou te amar!

Paulo José da Silva